quinta-feira, 14 de maio de 2009

Enem terá ao menos duas edições por ano

Folha de S. Paulo
Objetivo é se adaptar ao calendário das federais que têm mais de um vestibular anual, segundo ministro da Educação

No primeiro semestre de 2010, a prova deve ocorrer entre março e abril; edição deste ano está marcada para 3 e 4 de outubro

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DA REPORTAGEM LOCAL

O novo Enem, criado para substituir o vestibular nas universidades federais, terá pelo menos duas edições por ano, disse ontem o ministro Fernando Haddad (Educação).
A ideia é se adaptar ao calendário das universidades -algumas fazem mais de um vestibular por ano. A prova deste ano ocorrerá em outubro; a primeira de 2010, em março ou abril.
Há a possibilidade de o MEC promover mais de duas edições por ano, mas isso depende de orçamento, afirmou o ministro.
Até agora, 21 das 55 universidades federais anunciaram que vão aderir ao exame como única forma de seleção; sete não vão usar a prova neste ano.

Razões da mudança
O antigo Enem foi criado para o aluno se autoavaliar. Depois, passou a fazer parte do vestibular de faculdades e foi utilizado para comparar os desempenhos das escolas.
O ministério tem dois objetivos com a mudança: unificar a seleção de calouros para as federais e reestruturar o currículo do ensino médio.
O governo federal também entende que o modelo atual, em que cada universidade tem o seu vestibular, prejudica os estudantes com menor renda, que precisam se deslocar para diversas cidades.
Na nova modalidade, o número de questões passa de 63 para 200, mais a redação. Serão dois dias de prova.
As notas do Enem não terão validade limitada, já que o nível de dificuldade será sempre o mesmo. Um aluno pode, por exemplo, usar a nota de 2009 em uma seleção de 2011.
O novo exame é inspirado no modelo americano de seleção (SAT), que acontece sete vezes por ano. Ontem, o ministro apresentou a reitores das universidades a lista de conteúdos e habilidades exigidos na prova.
A ideia é que o novo Enem mantenha a maneira como as perguntas hoje são formuladas, privilegiando a capacidade de raciocínio em detrimento da memorização. A prova deverá ainda exigir um pouco mais de conteúdo informativo, mas sem decoreba.
A lista desses conteúdos será divulgada hoje no site do MEC. Segundo o ministro, ela corresponderá àquilo que já é ensinado hoje no ensino médio, até para que os estudantes não sejam prejudicados. "O aluno que se saía bem no vestibular tradicional vai se sair igualmente bem no novo Enem", afirmou.
Amaro Lins, presidente da Andifes (associação dos reitores das universidades federais), diz que na prova de matemática, por exemplo, será avaliada a capacidade de interpretação de gráficos e a ligação de disciplina com fenômenos do dia a dia.
Um simulado será divulgado pelo MEC nas próximas semanas. No exame, as 200 questões terão diferentes níveis de dificuldade. As mais complexas são fundamentais para permitir uma melhor seleção de alunos em carreiras mais concorridas, como medicina.análise

Em 400 anos, provas quase não mudaram
HÉLIO SCHWARTSMAN
DA REDAÇÃO

Apesar da revolução científica e de avanços na pedagogia, a noção de prova escolar sofreu muito poucas alterações desde sua criação pelos jesuítas quatro séculos atrás.
Tamanha estabilidade se justifica: o conceito funciona. Não é preciso mais do que fazer algumas perguntas aos alunos para distinguir aqueles que dominam a matéria dos que aprenderam pouco. Embora muitos tentem, é difícil enganar uma prova.
Mesmo testes de múltipla escolha, criticados por nove entre dez pedagogos, são bastante eficientes na hora de separar bons de maus alunos.
Estudo da Fuvest divulgado em 2005 mostrou que, se a segunda fase do exame (da qual constam as questões dissertativas) fosse eliminada, a relação final dos aprovados mudaria pouco, de 3% a 6%. Ou seja, em um curso com 50 vagas oferecidas, no máximo três vestibulandos que não estivessem entre os 50 mais bem posicionados nos testes da primeira etapa seriam aprovados por conta de seu desempenho nas respostas escritas.
Isso não significa que não haja vantagens em substituir os vestibulares pelo Enem. Elas existem e são muitas. As mais palpáveis são de ordem logística. O candidato a uma vaga no ensino superior não precisaria mais submeter-se a uma maratona de provas. Também seria poupado das múltiplas taxas de exame cobradas pelas universidades.
Igualmente interessante, o sistema de ensino superior ganharia mobilidade. Um aluno formado no Nordeste, por exemplo, munido de sua nota nacional teria melhores condições de pleitear vagas em instituições do Sudeste.
Outro efeito positivo tende a dar-se sobre a organização dos "curricula". Atualmente, são os principais vestibulares que, numa inversão de papéis, acabam definindo o que as escolas ensinam. Um colégio pode até querer ensinar linguística em vez de gramática prescritiva ou mecânica quântica no lugar de física newtoniana -posições em princípio justificáveis-, mas dificilmente o fará porque precisa responder à demanda de preparar seus alunos para o vestibular.
Se o novo Enem de fato ganhar aceitação e firmar-se como uma prova que valorize mais a capacidade de raciocínio do que a memorização de conteúdos, as escolas não precisariam desdobrar-se para cobrir toda a matéria exigida nos vestibulares. Reencontrariam, então, espaço para trabalhar melhor o que consideram ser suas prioridades e até para experimentar um pouco mais.

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